Pra te ver melhor: monotipias de Kika Levy, por Ana Angélica Albano - Janaina Torres

São Paulo Brasil

Pra te ver melhor: monotipias de Kika Levy, por Ana Angélica Albano

6 de novembro de 2017 | 18:07
A artista Kika Levy, no ateliê de gravura da Oficina Cultural Oswald de Andrade. Foto: Nina Levy

Delicadeza e precisão. De posse desses dois atributos tão caros à arte, Kika Levy nos presenteia com monotipias reveladoras da natureza que nos cerca – e de novos caminhos de seu próprio trabalho. Fruto de sua residência artística no ateliê de gravura da Oficina Cultural Oswald de Andrade, que expõe até dezembro o trabalho da artista, Kika Levy trabalhou pela primeira vez em prensa de grandes dimensões. O resultado são folhas nada frágeis, mas poderosas – que resistem ao tempo e a um único olhar. Revelam-se aos poucos, numa beleza de amplos significados, que são elaborados pela curadora Ana Angélica Albano, no texto a seguir.

Veja as monotipias de Kika Levy clicando aqui. 

Kika Levy em seu novo habitat: folhas e a prensa de grandes dimensões. Foto: Roberto Seba

Pra te ver melhor

Por Ana Angélica Albano 

Eu bem sabia que a nossa visão é um ato poético do olharManoel de Barros

A profunda intimidade que Kika Levy tem com as plantas, permite-lhe dirigir-se a cada uma na segunda pessoa do singular. Aproxima-se delas com um delicado pedido de licença: “- pra te ver melhor…”

As lupas já foram grande aliadas, quando seu interesse estava voltado para plantas muito pequenas e a auxiliaram na observação de detalhes ínfimos que deram passagem a desenhos diminutos, miniaturas de gravura, pequenas joias. E  parecia confortável expressando-se neste formato, totalmente em acordo com sua natureza de observadora silenciosa.

Foto: Roberto Seba

Com a oportunidade de realizar a residência artística no ateliê de gravura da Oficina Cultural Oswald de Andrade em 2017, com uma prensa de grande porte, revela-se uma outra face da artista. O tamanho da prensa permite o uso de papel maior (107 x 80 cm).

Despede-se, então, das lupas, sai em busca de plantas que possam se mostrar à vontade em papéis desta dimensão e o passeio ao Parque Alfredo Volpi, área remanescente da Mata Atlântica no Morumbi, em plena cidade de São Paulo, torna-se parte de sua rotina.

A cada semana seu olhar deixa-se capturar por diferentes texturas, formatos, nervuras e seleciona, entre a enorme variedade existente na mata, as folhas que serão levadas ao ateliê para serem melhor vistas…

Como Matisse já nos ensinara “a criação, para o artista, começa com a visão. Ver já é uma operação que exige esforço.” No esforço para ver melhor, a artista não recorre desta vez ao desenho, seu antigo aliado, mas à sua experiência de gravadora. Porém, ao invés de gravar, imprime a própria folha em sucessivas monotipias.

Na primeira monotipia, a planta é colocada diretamente sobre o papel, que ao ser submetida à prensa revela seu relevo. Nesta etapa apenas a seiva colore algumas partes, quase uma aquarela que muda de tom conforme vai secando.

Na segunda, a folha é colocada sobre uma superfície entintada e depois coberta com o papel, que ao passar pela prensa, além do relevo, mostra a planta em negativo sobre o papel com cor.

Para a terceira monotipia o papel é colocado diretamente sobre a placa tintada onde a planta deixou sua marca, imprimindo, bem delineada, a estrutura da folha sobre um fundo de cor suave. Às vezes, o que resta desta impressão ainda pode gerar uma nova imagem menos nítida, mais sutil, quase uma recordação.

Ainda há a possibilidade de mais uma monotipia, imprimindo a folha, quando sai da superfície tintada, sobre o papel branco. E, como na etapa anterior, o processo pode ser repetido até o desaparecimento total da imagem.

Embora a mesma planta se repita em quatro monotipias diferentes, cada imagem é única e, em cada uma se renova o desejo: pra te ver melhor.

Ora (direis) olhar plantas!

A supresa, no entanto, é que na procura de ver melhor seu objeto de trabalho, Kika enfrenta desafios, acolhe acasos, desaloja certezas, voltando o olhar para o seu próprio processo de criação, que se renova, renovando-nos.

Ana Angélica Albano, Verão de 2018

Veja as monotipias de Kika Levy clicando aqui.

Mais sobre Kika Levy

Monotipias de Kika Levy (série completa)

A terra e o fogo nas Paisagens Vermelhas de Kika Levy

Página da artista (Janaina Torres Galeria)

No ateliê: Kika Levy

KIka Levy – site da artista

Veja também

Kika Levy – Série Paisagens Vermelhas – gravuras (veja todas aqui)

Kika Levy, Sem título I, 2017, Gravura em metal, 40 x 40 cm
Leia Também
EXPOSIÇÕES & VIEWING ROOMS

Liene Bosquê

ARQUEOLOGIAS MIGRANTES

HamacaS

Liene Bosquê

Guilherme Santos da Silva

PRA VELA NÃO SE APAGAR

Nós usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossos serviços. Ao utilizar nossos serviços, você concorda com tal monitoramento.

Aceitar